3.2.07

Diário de um aquário


O que define a natação não é a monotonia. É a solidão. Na natação, a solidão é a via de acesso a uma espécie de estado meditativo, no qual reside um dos grandes prazeres do esporte. A natação impõe, logo de cara, um bloqueio sensorial: enxerga-se apenas o fundo da piscina/lagoa/oceano ou o breu das águas escuras; escuta-se apenas o som da água agitada por braçadas e pernadas; o tato é privado da sensação de solidez e passa a lidar somente com a resistência da água; a seqüência coordenada de braçadas, pernadas, movimentos de cabeça, respirações e viradas é contínua e os movimentos repetitivos livram progressivamente a consciência de mais essa preocupação corporal, até que em algum momento, se o treino for constante e o cérebro der conta da atividade física e da percepção do mundo em piloto semi-automático, o nadador se vê a sós com seus pensamentos.

Daniel Galera, "No mar de Copacabana não tem leviatã", revista Piauí, nº 4

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